Era uma miúda meio assustada, perdida e imóvel à porta do hotel. A situação em Díli, no final de 1999, era ainda perigosa, as forças das Nações Unidas ainda não controlovam todo o território de Timor-Leste.
Não sei há quanto tempo por lá andava quando dei com ela. Sei que estava parada, imóvel, à espera do dia em que a fossem buscar, como se já tivesse ido embora. Falava de uma menina com saudade e emoção e por ela recusava-se a levar na cara com a exposição da extrema miséria que matava crianças à fome e doença.
O Leonel de Castro arrastou-a connosco por duas ou três vezes em deslocações difíceis, mas não de risco, e ela agradeceu a cumplicidade com um sorriso bonito num olhar aberto, vivo, e com palavras, muitas palavras, nenhuma guineense, até parecia que nunca mais se calava.
A Cadi Fernandes morreu nesta segunda-feira de cancro no pulmão. E a memória do tempo em que a profissão também significava felicidade está cada vez mais povoada de gente que, de algum modo, acabou por desaparecer.
P.S.: já depois de publicadas estas linhas, dou de frente com um belo texto de um outro grande cronista português, Fernando Madail, do DN, tal como a Cadi. Uma pequeníssima parte do que lá está reproduzido também faz parte de mim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário